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Recuperação Judicial: A necessidade de apresentação de certidão negativa de débito tributário como requisito para a sua concessão

Autor: Sara Cury

Data: 12/01/2024

Recuperação judicial
Recuperação judicial – Imagem de um homem utilizando um notebook

No âmbito da Recuperação Judicial, há diversos atores que possibilitam a reestruturação da empresa em crise econômico-financeira, dentre os quais encontram-se os credores, principais interessados na reorganização empresarial, haja vista que, com essa, haverá o pagamento – ainda que parcial – de seus créditos sujeitos à Recuperação Judicial. Dentre esses credores, há os chamados “credores hold out”, isto é, os credores com poder de orientar todo o processo recuperacional por meio de suas decisões, em razão das garantias vinculadas ao seu crédito, as quais asseguram a eles maior poderio de veto e direcionamento do pleito recuperacional, a exemplo do fisco.

No Brasil, é inviável que o crédito tributário esteja sujeito à Recuperação Judicial, pois a anuência com possíveis alterações às condições de pagamento deste tipo de crédito está vinculada à autorização legal específica nos moldes do CTN, anuência esta necessária ao andamento do procedimento recuperacional quando da aprovação do Plano de Recuperação Judicial e posterior novação das dívidas. Em razão disso, o crédito fiscal não está sujeito ao procedimento recuperacional. Dispõe a Lei n. 11.101/2005:

Art. 57. Após a juntada aos autos do plano aprovado pela assembléia-geral de credores ou decorrido o prazo previsto no art. 55 desta Lei sem objeção de credores, o devedor apresentará certidões negativas de débitos tributários nos termos dos arts. 151, 205, 206 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.

Bem como:

Art. 68. As Fazendas Públicas e o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS poderão deferir, nos termos da legislação específica, parcelamento de seus créditos, em sede de recuperação judicial, de acordo com os parâmetros estabelecidos na Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.

Pressupondo uma negociação estruturada entre a Recuperanda e o fisco para a concessão da Recuperação Judicial da empresa em crise, apesar de sua não sujeição à RJ. Isso, pois, entende-se que, muito embora o crédito tributário não se sujeite a este beneplácito, o instituto da Recuperação Judicial não pode ser utilizado para privilegiar alguns credores em detrimento de outros[1]. Todavia, até a mudança normativa ocorrida por meio da Lei n. 14.112, de 2020, que alterou dispositivos sobre o procedimento recuperacional na lei específica, Lei n. 11.101/2005, o texto legal sobre a apresentação da certidão de regularidade fiscal era norma meramente fictícia, tendo em vista que a dívida fiscal dificilmente era quitada por empresas em crise, as quais, geralmente possuíam alto passivo tributário e/ou aderiam a programas de parcelamento de dívidas irreais, uma vez que esses eram inviáveis à uma empresa insolvente.

Foi diante deste cenário que, em 2020, incluiu-se o seguinte dispositivo na Lei n. 10.522/2002, sobre o Cadastro Informativo dos créditos não quitados de órgãos e entidades federais:

Art. 10-A. O empresário ou a sociedade empresária que pleitear ou tiver deferido o processamento da recuperação judicial, nos termos dos arts. 51, 52 e 70 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, poderá liquidar os seus débitos para com a Fazenda Nacional existentes, ainda que não vencidos até a data do protocolo da petição inicial da recuperação judicial, de natureza tributária ou não tributária, constituídos ou não, inscritos ou não em dívida ativa, mediante a opção por uma das seguintes modalidades: (Redação dada pela Lei nº 14.112, de 2020)

Criando modalidades especiais de parcelamento para as empresas em Recuperação Judicial e possibilitando novas possibilidades para equacionar a dívida fiscal. Com ela, foram criadas diversas ferramentas mais compatíveis com a realidade de uma empresa em situação de insolvência.

Contudo, apesar dessas novas ferramentas mais viáveis para a empresa devedora, ainda assim muitos juízes dispensavam a comprovação da regularidade fiscal, optando pela não aplicação do art. 57 da Lei n. 11.101/2005, fortalecidos pelo entendimento do STJ pela inexigibilidade da comprovação da regularidade fiscal para concessão da Recuperação Judicial, mesmo após as alterações[2].

No entanto, de modo a pacificar essa questão, em 17/10/2023, no julgamento do REsp 2053240 / SP, a Terceira Turma alterou esse entendimento e foi estabelecido que “não cabe mais ao juiz dispensar a comprovação da regularidade fiscal para conceder a recuperação judicial da empresa devedora”, alterando a possibilidade de não aplicação do art. 57 da Lei 11.101[3]. Assim, diante desse novo entendimento, o fisco recebe seu crédito, a empresa recuperanda equaciona seu passivo fiscal e encerram-se as execuções fiscais paralelas à Recuperação Judicial, tendo em vista a garantia da negociação fiscal pré-deferimento da RJ.

Dessa forma, a partir de outubro de 2023, passa a ser obrigatória a apresentação de documentos que comprovem a regularidade fiscal da empresa que pleiteia o benefício recuperacional, de modo que a concessão da Recuperação Judicial passa, efetivamente, a depender da equalização de eventual débito fiscal existente em nome da devedora, seja por meio da quitação do crédito tributário, seja por meio da comprovação da negociação dele.

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[1] SACRAMONE. Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. P. 309.

[2] Vide REsp 1.187.404/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Corte Especial, DJe de 21/8/2013 e AgInt no REsp n. 1.726.128/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 27/3/2023.

[3] Vide REsp 1.187.404/MT, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Corte Especial, DJe de 21/8/2013 e AgInt no REsp n. 1.726.128/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 6/3/2023, DJe de 27/3/2023.

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